ERA UMA VEZ NO MÉXICO

"Ao perguntar-se o que é a vida, e qual a finalidade da mesma, não saberíamos responder de pronto, mas uma coisa é certa; ora a vida é cheia, ora a vida é vazia, e ora a vida é pelo meio. Sem sentir nada, é que ninguém passa. Talvez até esqueça o sentimento, mas duvido quem não sofreu ou foi feliz, por causa exclusivamente de alguém. Que seja uma dor, seja ela de amor ou de arrependimento".

Zezé trabalha cortando cabelos no salão de beleza da Marlene, e adora ficar puxando um assunto com os clientes e colegas de ofício. Qualquer coisa que a distraia de sua vidinha boba e sem graça. E porque mais uma vez, o vadio do Marcelo se foi para a casa da mãe, e ela estava cansada de esperar maturidade da parte dele. Talvez casar não tenha sido realmente uma boa ideia afinal.
O senhor Lindolfo é que o diga, pois além de já ter vivido um bocado, e também ter visto muita coisa na vida. O velhote disse-lhe certa vez, que nunca tinha amado alguém verdadeiramente.
— Como assim, o senhor nunca amou ninguém?
— Talvez eu tenha me apaixonado na escola, mas faz tanto tempo, que até me esqueci.
— Nenhum amor, a sério?
— Nenhum que me lembre. Tive algumas paixões passageiras, mas como isso já diz, foi muito rápido. Agora que mencionei, lembrei-me de uma moça que conheci na minha juventude, no México. — Os olhos de Zezé brilharam. — Conte então seu Lindolfo. Adoro um romance.
— Era primeira vez que eu ia ao México em intercambio cultural de idiomas. Fiquei hospedado na casa dos Benites, porque o filho deles estava em outro ponto do mundo, enquanto eu ocupava seu quarto e partilhava do convívio de sua família.
Uma vez fui às touradas, e sinceramente, não consegui ver "aquilo", pois achei o espetáculo uma barbaridade, então sai no meio da coisa, e fui andar pela cidade. Sentei-me no primeiro café que encontrei, e lá estava ela...
Tinha o livro de poesia nas mãos, pensei em pedir licença e sentar-me junto, ela estava lendo tão compenetrada que não tive coragem de interrompê-la, mas deu vontade. Então sentei noutro canto e fui beber... E ela chegou-se.
— Posso sentar-me contigo? — Surpreso arrematei logo. — Claro, fique a vontade.
Ela apresentou-se. — Madalena. — Eu também me apresentei, e ficamos na conversa. Ela era italiana e estava estudando pelo intercambio também. Ficamos amigos e passamos a nos ver com frequência, e era tanta a frequência que não queríamos mais nem voltar para casa. Mas os meses voaram, e um dia voltamos cada um para seu canto do mundo.
Zezé faz cara de decepção: — Mas nunca mais se viram, por quê?
— Porque a vida é assim, porque eu não tive coragem. Ela queria mesmo que fosse lá ou cá, ela queria.
— Que pena seu Lindolfo. O senhor teve medo de que?
— Achei o mundo grande demais, tive medo de perder alguma coisa. Só mais tarde é que descobri, que eu estava perdendo naquele exato momento. é difícil abandonar velhos hábitos, atirar-se para a aventura. Talvez eu tenha ficado com medo de tamanha felicidade.
— E hoje tudo é tão ao alcance da mão e mesmo assim há muitos medrosos, não se preocupe que o senhor não está sozinho nessa legião.
Ontem contei ao meu namorado que estava grávida, e sabes o que ele fez? Resolveu correr para a casa da mamãe. O senhor acredita! Eu entendi que agora eu terei de assumir o meu filho, sozinha ou tolerar as idas e vindas do “papai” covarde.
— Mas, eu se tivesse tido um filho com Madalena, teria ficado com ela.
— Me desculpe à franqueza seu Lindolfo. O senhor está dizendo que ficaria com Madalena por obrigação, não por amor, e não acredito que ela gostasse disso. E outra questão interessante, se ela quisesse podia ter dado o golpe da barriga, ou não? Penso que Madalena só queria que o senhor a quisesse, pura e simplesmente.
Sabe que vocês homens são engraçados, vão morrer de velhos, e ainda não vão compreender uma mulher!
— Talvez você tenha razão. Eu espero que Madalena tenha tido mais sorte, e que tenha encontrado alguém que gostasse dela, como eu gostei, e que não tivesse medo.
— Ahhhh ... Então o senhor a amou!
— Olha menina, confesso que vivi alguma coisa com ela, mas passou o tempo. Ela deve estar feliz com outra pessoa agora.— Zezé percebe que o velho fica agitado.
— Me desculpe senhor Lindolfo, às vezes eu falo demais. É que parece infinitamente mais fácil palpitar na vida alheia do que na nossa própria. — Pronto, ficou lindo o seu cabelo.
O velhote confirma que gostou, paga o corte, despede-se e vai embora.
Por alguma razão, Zezé ficou com pena daquele senhor, sempre sério e triste. Também pensou em Marcelo que nunca se decidia. 
— Homens!
Por fim a moça deu de ombros, e foi atender o próximo cliente.

#Guerreiraxue
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Comentários

  1. Olá, amiga. Li e gostei muito. Hoje em dia não me concentro a ler leituras grandes. Pois,li tudo e estive sempre concentrada, porque me interessou o que estava a ler. Parabéns. Continue! Beijinhos

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