Uma Temporada de Facões

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Durante a primavera de 1994, 800 mil tútsis foram mortos a golpes de facão, em Ruanda. Numa rotina que durou quase cem dias, das 9h30 às 16h, os hútus saíam de casa cantando e vasculhavam os pântanos em busca dos próprios vizinhos. Decepavam até o final do expediente. À noite, bebiam cerveja, trocavam mexericos, contavam piadas e afiavam as ferramentas nas pedras-pomes. "Matar era menos cansativo do que plantar", dizem. "Bastava vasculhar para colher".

Dez anos depois, o jornalista Jean Hatzfeld instalou-se em Ruanda para entender o genocídio. Em Dans le nu de la vie (2000), registrou o testemunho das vítimas sobreviventes; agora, em Uma temporada de facões , ouve os matadores. Como diz Susan Sontag na apresentação do livro, "Esforçar-se para entender o que aconteceu em Ruanda é uma tarefa dolorosa da qual não temos o direito de nos esquivar - faz parte de ser um adulto moral".

Com enorme franqueza e muitas vezes até com candura, dez dos assassinos falam sobre a organização e execução da matança, a banalidade, o ódio, o arrependimento e o perdão. Discursam sobre o horror e o indizível. Nas conversas, uma angustiante constatação: são pessoas comuns, sem traços de ferocidade. Pais de família, jogadores de futebol, professores e lavradores que deceparam amigos íntimos sem constrangimento e, no final, fariam tudo novamente.

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