A MOÇA DAS TRUFAS

Algumas pessoas nascem com tanta sorte e facilidades na vida, que até chega a fazer raiva. A Giovana era uma dessas riquinhas, tanto que ao chegar na cidade grande, a moça se depara com as disparidades sociais comuns, que até então nunca tinha visto em sua curta vida. 
 Não foram poucas as vezes que a mocinha pensou em arrumar a mala novamente e correr para casa, onde além do aconchego do lar havia também os pais. Mas no fundo do coração ela sabia que precisava vencer mais esse primeiro desafio, a universidade. A transição em geral pode ser dolorida, mas se faz necessária, pois sair do ninho é o destino de qualquer passarinho.

Já no primeiro dia um professor de sociologia pediu para cada um, da turma, que ficasse de pé e falasse um pouco de si, apresentando-se.
Você há de convir que é vergonhoso ter orgulho da riqueza já que a miséria mata até a dignidade humana. E Giovana não era orgulhosa nem nada, aliás, descobriu-se uma completa alienada.
E porque todos agem normalmente, então a moça percebe que para não parecer uma retardada mental fingia a mesma naturalidade dos demais. O que a salvava era a mãe, voltando em casa um domingo por mês. — Eu sei da pobreza do mundo mãe, só que nunca tinha visto tão de perto.
E a mãe, mulher simples que nunca tinha saído do campo, escutava cada palavra da filha.
— Conheci a Laura, a moça das trufas. A garota é a quarta numa família de seis filhos, e veio de Bom Jesus. O pai é lavrador, a mãe trabalha de lavadeira para as gentes da cidade. Ela passou no vestibular em primeiro lugar para medicina e estuda com bolsa integral. A família não tem condição alguma de custeá-la na faculdade, e mesmo assim ela está "tentando". Ela recebe todo mês seiscentos reais, do qual tem que pagar oitenta por cento de estadia, sobrando-lhe duzentos reais para se manter. Sabe o que ela faz mamãe? Usa o dinheiro restante para fazer trufas e sai a vender pelo campus. E eu sinceramente não sei que hora ela estuda ou dorme. Mas a obstinação dela é tão contagiante que acabei por fazer um acordo com a turma. Um dia na semana, ela faz duas trufas para cada um da nossa sala inteira. E ao saber disso, outras turmas resolveram aderir. Tanto que a moça das trufas tem que recusar pedidos, pois do contrário não teria mais tempo para os estudos.

A mãe por sua vez, escondia a emoção da filha, porque aquilo era viver, sentir, e sofrer a dor alheia, mas também trazia-lhe a alternativa, o senso cooperativo e o valor da solidariedade.

Giovana e a moça das trufas se formaram. No dia da formatura de ambas, ao se despedirem. — Nunca me esquecerei de você enquanto viver. — Giovana retruca logo — Claro que não vais, tenho o teu contato e quando pudermos vamos nos ver.
Depois de 20 anos a doutora Giovana e Laura, a moça das trufas, mesmo vivendo em cidades diferentes ainda cultivam amizade.

#Guerreiraxue



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