LIVRO MAIOR

Do Livro Maior, fui o livro de poesias
perdido no fogo de Alexandria.
No Livro Maior, sou o arqueólogo do espanto
frente a versos desconhecidos.

Estranheza na beleza de ser um outro,
um novo, um pouco de conforto na tristeza.

Leio poesias da distância.
Tão distante sou de quem fui,
que quis conhecer-me antes da lua minguante.

Sou o depois e o antes.
Sou um "e" e um "doravante".

Já fui pauta para abrigar outros escritos,
Fui linhas em branco, folhas sem pauta,
anagramas de silêncio,

um fixo e intenso pensamento
a criar fantasmas,
que fossem mais que as aspas na minha citação:
uma ilusão persecutória
a preencher meu mundo transbordante de nadas.

Já fui um som rebuscado de difícil interpretação,
um mundo de exclamações e reticências...

No que restou de uma pueril inocência,
sou o perdão ao meu próprio deboche,
um ponto transtornado a encerrar o texto,
o pacote completo de virtudes almejadas
e vícios a tiracolo.

Alimento o monstro para que não me perturbe
e não me faça turba a obstruir outras estradas.

Sou uma alma-arma sempre engatilhada.
Sou os cartuchos de balas que não disparei.

Corro com os pincéis para alcançar as lágrimas, 
quando o não-dito, 
o não-sabido, por mim, fala.

Sou o surdo que tudo ouve,
e o cego que tudo vê.
Sou Argos a esperar pelo assassino.
Sou aquele que conhece o seu destino.

Sou o muro e o abraço.
Sou um laço, um elo, um túmulo.

Sonho tornar-me uma nota de rodapé,
ao leitor, quase esquecida,
ardendo nas chamas de Alexandria,
mas ainda citada no Livro Maior.

Deise Zandoná Flores
https://www.facebook.com/deisezandona
A imagem pode conter: céu e atividades ao ar livre


Comentários

  1. Leitura admirável! Curti cada palavra com o entusiasmo daquele que precisa escrever e adia as oportunidades... Belíssimo! Meus sinceros agradecimentos... Parabéns!

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