O RETORNO

Olhando em volta do castelo, Cátia percebe um cão a observa-la.
— Está tudo igual. Só eu, e este cão sarnento destoamos da paisagem aqui.
Concluiu a moça com um leve sorriso.
Cátia, tinha partido para a capital há tempos, em busca de fama e fortuna. E conseguiu.
Porém, uma força a induzia para voltar aquele lugar. Isso podia ser compreensível se tivesse alguém a esperá-la, mas não, todos lhe eram estranhos agora, e tão ocupados estavam com suas vidinhas que nem a perceberam ...
Vinte anos se tinham passado e tudo realmente, era passado.
Acenou ao motorista, que prontamente abriu a porta da limousine, para que ela se acomodasse.
O cão não deixava, contudo, de fita-la, sentado sobre as duas patas traseiras, escanzelado e expectante.
— Espere. — Diz a moça ao motorista. e andando na direção do cão, que ficou alerta pela  aproximação, porém não saía do lugar. Os dois se olhavam, como quem estudava um ao outro, por momentos que pareceram uma eternidade.
Pela aparência do bichano, este não devia ter ninguém, exatamente como ela. Levada por um impulso, ela tira seu casaco lentamente, enrola no animal mansamente, e o carrega para o carro.
Mais a frente, na mesma rua, param num veterinário. O cão faminto é examinado e logo é alimentado.
Explicando que o achou abandonado e que ficara com pena do pobre coitado. Sem mencionar que achou-o parecido com ela.
A veterinária poderia ter dito para quela moça elegante que, aquilo era só fome e falta de cuidados mesmo. Poderia também dizer  que, se ela estava a fim de dar-lhe comida, que desse e depois seguisse seu caminho de volta para a sua confortável casa.
Porém, mesmo sabendo que o cão não era dela, a veterinária recomendou:
— Por indicação, ele deve ficar internado até fazer todos os exames. Tomar banho, vacinas, etc...
Que fazer agora? Cátia não queria o cão. Porque cargas d'agua foi juntar este vira-lata?
De novo outro impulso.
— Tudo bem, no final do dia eu volto.
Ela ia prolongar um pouco mais sua estadia na cidade, e logo por causa de um cão sem dono!
Andando pelas ruas, Cátia entra num pequeno restaurante. Faz seu pedido e espera...
— Porque diabos fui pegar aquele cão? — Se perguntava
— Só vim dar uma passeada. e eu a logo embora. Agora sem coragem de devolve-lo à rua, a moça se obrigava a ficar o dia na cidade onde nasceu.
Cardoso (foi o nome que o cão deu a si próprio) estava feliz e ainda mal acreditando na sua sorte. Já tinha tentado este golpe várias vezes, mas, finalmente hoje tivera sucesso. Ele sabia que não tinha doença nenhuma, era apenas fome. Se a sorte continuasse, talvez a busca de comida e de fêmea fosse coisa do passado.
Gustavo, o dono do restaurante, estava tendo um dia difícil. Além do calor infernal naquela cozinha, pois o sugador de ar deu defeito, dois de seus garçons resolveram tirar folga por conta própria, e agora, o salão estava lotado de clientes. E ele mesmo havia de se encarregar do atendimento as mesas.
Quando ele atende Cátia sente que a conhece — Caramba. — pensa ele. — Que moça bonita!.
Sem se distrair muito, o dono de estabelecimento vai e vem, leva e busca. Precisava atender os demais.
— Eu conheço esta mulher de onde? — Matutava o rapaz.

São interessantes os caminhos das pessoas. Motivações constantemente variam dentro da esfera diária de convívio dos seres. Há fatos que só um bom "olheiro" pode perceber.
Nem Gustavo, nem Cátia, nem a veterinária ou Cardoso têm ideia, mas já se cruzaram outras vezes.
O destino os coloca frente a frente, de uma tal forma, que só lhes resta um opção. A escolha.
Vejamos agora onde se "encaixam" os personagens em questão.
No caso do cãozinho, por exemplo: Este, e a veterinária já se haviam cruzado pelas ruas da cidade. E para tristeza de Cardoso, era sempre ignorado. A vida de vadio pode ter lá seus encantos, porém o vira-lata não achava de todo ruim ter um lar. Cardoso tentava com frequência este estratagema.Sempre que podia, preparava aquele"olhar"de coitadinho. Se não der agora, quem sabe outra hora...Mas desta vez ele tinha a certeza que resultara. Era o seu grande dia, tinha de aproveitar! Um cão não precisa de pensar com palavras para ter a certeza de que será bem tratado por alguém que o acolhe, mas duvida sempre da sorte que tem, porque sabe que não se pode confiar nunca totalmente nos humanos. Ele confiou nela logo que ela pegou nele ao colo. "Ela não me quer, foi por impulso que o fez, mas o que me interessa isso, se sei que nunca mais terá coragem de me abandonar!" Era o que ele pensava quando o motorista foi buscá-lo e enquanto esperava à porta do restaurante pela sua recente dona. Cátia estava virada para ele, do outro lado do vidro, sempre a fixá-lo, como se tivesse medo que ele desaparecesse de repente. Mas, isso não aconteceu.
Cátia termina seu almoço e paga o devido, agradece e se retira sem se aperceber do atendente.
Uma vez do lado fora, ela pega o cãozinho nos braços novamente, e se dirige para o carro e ao sentar
 pegou nele ao colo e beijou-o no focinho. O rabo dele abanava tanto, que sentiu vergonha de estar tão excitado, mas não podia evitar, estava mesmo fora de si, nunca nenhuma mulher lhe tinha beijado o focinho!
De repente, sem qualquer razão aparente a moça sente uma alegria imensa no coração.
  —  Que vira-lata lindo este!— Murmura mais para si mesma, que o motorista mal ouviu.
Beija-o mais como se finalmente o aceitasse como "seu".
Entra no carro e vai embora.
Há de pensar o caro leitor. Só isso? Onde está a coincidência do sujeito do restaurante?
Pois eu lhe respondo de pronto, que eu sou destino, e não manipulador de vidas.
Tudo está a disposição de todos, neste mundo e ver, é uma questão crucial, para se aprender.
E no caso de Gustavo e Cátia ambos estavam por demais embrenhados em suas prioridades para repararem um no outro.
Foram colegas de escola na adolescência, e mal se cumprimentava na época.
Não foi hoje o "reconhecimento", pelo que se pode entender.
Em dois anos, eles se encontrarão de novo, na Itália. E mais uma vez, terão a opção da escolha...

                                

Comentários

  1. Mas que delícia de conto, amiguinha!
    Mas pelas tuas ricas alminhas, quero e já, o resto da estória do Gustavo e da Cátia. Não é justo o suspense criado. Exijo que o Gustavo seja tratado como o Cardoso, está bem? :) :)
    Repito, o conto é uma delicia. Continua, amiguinha!
    Um abraço do tamanho do mundo.


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    1. Ó ZÉ DEVES ANDAR "DESESPERADO" AO PONTO DE QUERERES O TRATAMENTO DE UM CÃO, AH!AH!

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  2. COMO DESCALÇAR ESTA BOTA? NÃO SEI BEM, MAS NÃO CUSTA TENTAR;QUANDO ESTAMOS DOIS OU MAIS ANOS SEM IR A UM SÍTIO O RETORNO É SEMPRE DIFICIL E ACONTECE-NOS COMO À CÁTIA TUDO NOS PARECE FAMILIAR, APESAR DE NÃO SABER-MOS COMO NEM PORQUÊ. SERÁ K UM CÃO NOS FICA NO "OLHO"? CREIO K SIM, QUER SEJA PELO SEU MEIGO OLHAR OU POR A RAZÃO INVERSA;QUANTO À RECORDAÇÃO DE OUTRA PESSOA, A COISA TORNA-SE MAIS DIFICIL (EM MEU PARECER) POIS O NOSSO CORPO MUDA BASTANTE, CONSEQUÊNCIA POR VEZES ATÉ DA MANEIRA DE NOS VESTIR-MOS.ORA AQUI ESTÁ BEM CLARO K FOI MESMO ESSA A RAZÃO DE ELES NÃO SE RECONHECEREM UM AO OUTRO, NÃO SE VIAM DESDE OS TEMPOS DE ESCOLA ONDE POR NORMA NINGUÉM LIGA MUITO UNS AOS OUTROS (POR VEZES ATÉ POR VERGONHA), HOJE ELE ATRÁS DE UM BALCÃO (DECERTO TERIA UMA FARDA) E ELA BEM ARRANJADA COM ROUPAS ELEGANTES (O FACTO DE TER MOTORISTA ME LEVA A PENSAR ASSIM)COMO ERA POSSÍVEL TEREM TIDO A LEMBRANÇA DE ONDE JÁ SE CONHECIAM??? A MEU VER O ÚNICO BENIFICIADO FOI MESMO O CÃO COM O SEU OLHAR Nº 1, AH!AH! VALERAM AS TENTATIVAS, NÃO ACHAS HILDA?

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